“Quem começou com a descentralização foi um governo do PS e só não foi mais longe porque não teve apoios”, referiu o presidente da Câmara de Águeda, eleito pelo PS em três mandatos consecutivos. Gil Nadais defendia-se das críticas dirigidas pelos membros do Partido Socialista eleitos para a Assembleia Municipal a propósito na chamada municipalização da educação.
A adesão de Águeda ao contrato interadministrativo com o Governo para a delegação de competências na área da educação, a entrar em vigor no próximo ano letivo e com a duração de quatro anos, foi aprovada. A sessão, virada politicamente do avesso, revelou posições curiosas (leia nas edições e-paper e impressa do RA) que ficam para a história.
O próprio presidente da Câmara, ex-vice presidente de um executivo maioritariamente social-democrata e ex-PSD até se incompatibilizar com a estrutura local do partido, está desde 2005 na presidência pelo PS, terminando com as consecutivas vitórias eleitorais “laranjas” e reforçando de eleição em eleição o domínio “rosa” no município.
Gil Nadais não vai poder recandidatar-se ao fim de 12 anos na presidência e viu acentuar-se na última assembleia as críticas dos socialistas mais convictos. Foi assim em sessão anterior que discutiu a questão dos terrenos do GICA que a autarquia quer comprar, foi agora com a municipalização da educação.
“Uma coisa é estar na oposição e outra é chegar ao governo e as coisas então mudam… Seja PS, seja PSD”, disse o autarca, após intervenções dos socialistas Paulo Tomaz, Paulo Seara (também presidente a Junta de Freguesia de Águeda/Borralha), Carla Tavares e José Vidal.
“TODOS OS GOVERNOS CORTARAM NO PODER LOCAL”
Gil Nadais, procurando desmontar as intervenções dos seus colegas de partido, referiu que “todos os governos, desde que exerço funções, sempre cortaram no poder local”. E reforçou: “Uma coisa é o que dizemos, outra é o que fazemos!”
O autarca aguedense deu como exemplo uma transferência de competências do Governo para as autarquias sem a devida compensação: “Temos défice acentuado com os transportes escolares, o governo que transferiu prometeu compensar e nunca o fez. Foi no tempo do PSD mas depois o PS esteve no governo e continuou na mesma…”
Sobre a transferência de competências agora aprovada, o município de Águeda é um dos 13 do país que assinam este mês de abril o contrato interadministrativo com o Governo. “É uma profissão de fé!”, assumiu Gil Nadais na assembleia municipal. “Acredito que é possível fazer mais e melhor nas escolas”.
O presidente da Câmara de Águeda não sabe quanto irá custar a municipalização da educação ao município. “Sinceramente, não sabemos”, disse. Fala na educação como prioridade absoluta. “Não compreendo tanto alarme, o mínimo está garantido, a base é do Ministério; connosco é só daí para a frente”.
QUASE TUDO VIRADO DO AVESSO
Salvo a CDU, que rejeitou liminarmente o processo, a assembleia aproximou a restante oposição política (PSD e CDS-PP) do presidente socialista – que, na semana anterior, vira os quatro vereadores do seu partido e os dois do PSD e CDS-PP votarem unanimemente a favor da municipalização da educação, em reunião do executivo municipal.
Para Hilário Santos (PSD), “é apresentado um conjunto de boas intenções, a aprovação será uma carta em branco à Câmara”. Referindo-se ao posicionamento contrário dos socialistas, fez notar que “o PS não dá voto de confiança… alguma coisa está a mudar na relação do PS com o presidente”.
“Vão dar carta branca?”, questionou José Vidal (PS), quando os elementos do PSD e do CDS-PP davam indicações de aprovação. “Votam na credibilidade do presidente da Câmara depois de o terem atacado tantas vezes, com difamações pessoais”, fazia notar o socialista, para quem “não há pessoas de direita ou de esquerda; há políticas de direita ou de esquerda”.

Sete socialistas (um na mesa da AM) e o eleito pela CDU votaram contra a municipalização da educação
José Vidal considerou que “este processo começou mal e o presidente da Câmara deu cobertura! Se a Câmara conseguir cumprir o contrato treina alunos: os vossos filhos estão a ser treinados, não estão a ser ensinados! A educação não se mede em tijolos… este Governo levou a educação ao fundo, está no mínimo, e agora passa para a Câmara”.
Corrosivo, António Martins (CDS-PP) salientava que “genericamente, não temos o presidente da Câmara como irresponsável” e acrescentava: “Quando o PS em Águeda queria o poder não tinha com quem… Conquistaram o poder com a direita e queriam agora que Gil Nadais fosse de esquerda? Tem pretensões a outros voos e vai ter que provar que tem condições para tal”.
O único representante da CDU, Abrunhosa Simões, visivelmente agastado com o processo, acusava Gil Nadais pelo facto de “uma câmara maioritariamente socialista” deixar cair “uma das conquistas de Abril”. E acrescentava à sua argumentação: “O presidente da Câmara fala no vazio, mostra aqui que não sabe onde está metido e não responde a nenhuma das preocupações colocadas”.
TUDO UM “BOCADINHO PARTICULAR”
Nesta assembleia “um bocadinho particular”, como a definiu um membro social-democrata, três professores utilizaram o período reservado ao público para alertar os políticos – “tomem posições perante factos e não perante intenções e princípios”, apelou o sindicalista Vítor Januário, para considerar que “o contrato não tem qualquer preocupação com o objetivo da educação, que é formar cidadãos… os alunos surgem como uma conta!” – enquanto membros de associações de pais tomaram posição de apoio à “oportunidade” de aproximar a educação.
O presidente da Câmara Municipal de Águeda, Gil Nadais, disse querer definir “uma linha” com pais, professores e diretores de “todas” as escolas, incluindo Henrique Coelho, da desalinhada Adolfo Portela, com quem pretende reunir e “partir pedra”.
“Não queremos comprar qualquer projeto e impor, o projeto que a Universidade de Aveiro está a elaborar será participado por todos”, prometeu o autarca aguedense.
AUGUSTO SEMEDO